quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Poeta Zé de Mariano



EU E MEU LUGAR

Não me importa se alguém diga
Que sou poeta rasteiro
Que só falo em marmeleiro
Jurema preta e urtiga
Quem não quiser não me siga
Não fico contrariado
É que eu fui contaminado
Com a virose da pureza
Pra não fugir da beleza
Do lugar que fui criado.


Eu que sempre me encantei
Com o canto agudo do galo
Com a folha seca no talo
No lugar que me criei
Com as horas que descansei
Na sombra de um juazeiro
Como eu seria rasteiro
Se esquecesse a maneira
Do ringido da porteira
Despertando o tabuleiro.


Meu linguajar sertanejo
Meu jeitão de arigó
Minha espingarda o bogó
Pra mim é meu galantejo
Meu roçado quando vejo
Com o verde que DEUS criou
Se eu não fosse o que sou
Além de ser mal sujeito
Vivia mordendo o peito
Da mãe que me amamentou.


Quando esquecer minha terra
Que dei meus primeiros passos
Pra me juntar aos fracassos
Daqueles que falam em guerra
Trocar o meu pé de serra
Por casas a beira mar
Minha rede de pescar
Por redes feitas de lã
Nunca mais serei fã
Das coisas do meu lugar.


Como eu me comportaria,
Morando em um palacete
Sem pote e sem tamborete
Com luxo e com mordomia?
Com ressacas de orgia
Taças de champanhe na mão
Tendo o mar por inspiração
Ou o canto da sereia?
Mas prefiro a lua cheia
No céu azul do sertão.


Eu tenho medo que DEUS
Se negue a perdoar
Se eu deixar o meu lugar
Pra viver longe dos meus
E quando eu disser adeus
Bem na hora da partida
Uma saudade atrevida
Que me levasse guia
Ficasse por companhia
Pra o resto da minha vida.


Não quero ser endeusado
Defendendo a terra alheia
O cheiro da minha aldeia
Me deixa contagiado
Embora viva humilhado
Por quem não sabe o que tem
Mas mesmo assim vivo bem
Com minha sinceridade
Pobreza com honestidade
Não faz vergonha a ninguém.


Quero acordar bem cedinho
Pra vê os pássaros cantando
Alguns deles trabalhando
Na construção de seu ninho
Dar bom dia ao meu vizinho
Ouvir bom dia seu Zé
Tabira ficar de pé
E o tabirense escutando
Um poeta declamando
Um poema de Dedé.

(Tabira 24/01/2009)